domingo, 21 de março de 2010

Leia a entrevista com Denzel Washington sobre o épico apocalíptico “O Livro de Eli” que chega aos cinemas


Há seis meses Steve Weintraub, nosso correspondente em Los Angeles e editor do nosso site parceiro Collider, teve a oportunidade de visitar o set das filmagens de O Livro de Eli (The Book of Eli), o thriller apocalíptico dirigido pelos irmãos Allen e Albert Hughes.

Na trama, Denzel Washington é Eli, um herói que combate um impiedoso déspota, vivido Gary Oldman, enquanto caminha pelos Estados Unidos carregando um misterioso livro que poderá dar à sociedade o conhecimento que pode ajudá-la a alcançar a redenção.

Durante nossa visita, não vimos muitas caminhadas ou o tal livro do título, mas sim lutas e uma enorme explosão. Como na locação o clima era inóspito para entrevistas, com muito vento e nuvens de areia, Washington conversou com o pequeno grupo de jornalistas algumas semanas depois sobre seu personagem, a trama do filme, como foi trabalhar com Gary Oldman e o processo de atuação. Veja como foi a conversa:

Você poderia falar um pouco sobre o seu personagem e sobre o que é o filme?
Denzel Washington: Daqui a 31 anos existe um cara chamado Eli, que eu interpreto. Ele tem uma missão, que é atravessar o país com um livro que poderia mudar o mundo. O personagem do Gary Oldman é um líder carismático que quer esse livro, para que ele possa manipular a população e controlar o mundo, esse é o objetivo dele. Então nós nos unimos e vamos enfrentá-lo.

Eu gostaria de te perguntar mais sobre o passado de Eli. Considerando que o apocalipse aconteceu quando ele estava na adolescência, o que exatamente ele fez durante todo esse tempo e há quanto tempo ele está com o livro?
Fui tentando descobrir o meu personagem, então eu penso que eu tinha 17 anos e trabalhava em um supermercado ou algo assim. Todos deveriam ficar do lado de dentro por um ano depois da guerra, mas meu personagem saiu, vagou por aí e sobreviveu. Aliás, acabamos de gravar essa cena, então não vou contar todo o roteiro, mas basicamente ele sobreviveu e ouviu uma voz que o levou até o livro. A voz disse a ele aonde ir e porque, e que ele estaria protegido. Como ele diz, ele já está caminhando há 30 invernos. Então se foram mesmo 30 anos, eu diria que ele pegou o livro depois do segundo ou terceiro ano.

O aspecto que mais se destacou quando estávamos no set foi a quantidade de ação que estava rolando no filme. Esse é o filme mais desafiador, fisicamente, do qual você já participou?
Não. Eu fiz um filme de boxe chamado Hurricane – O Furacão, que foi igualmente difícil, apesar de que eu só lutava com um cara de cada vez. Nesse filme, tem uma cena que eu luto com uns seis caras e uma outra que são uns quinze, eu acho, e filmamos tudo em um plano-sequência. Mas sabe, eu tenho muita sorte de trabalhar com um dos melhores dublês de luta, como o Jeff Amata, que também foi treinado por um verdadeiro mestre das artes marciais, o Danny Inosanto, que por sua vez foi foi aluno do Bruce Lee. Nós começamos a treinar uns cinco ou seis meses antes das filmagens. Mas eu luto boxe há 15 anos, então pude trazer minhas habilidades do boxe para as artes marciais e as lutas com espadas. Foi intenso, mas foi muito divertido. Eu gostei.

O seu personagem é meio que um “lobo solitário”, quase algo saído dos faroestes do Sergio Leone, com o Clint Eastwood. Você usou esses personagens e filmes como uma referência para construir o Eli?
Não ativamente. Quer dizer, talvez os roteiristas tenham usado, eu não sei. Mas eu não assisti a um monte de filmes do Sergio Leone pensando neste projeto. Sabe, o personagem é solitário e o filme tem mesmo uma impressão de um clássico do Western que se encontra com, sei lá, um filme de karatê ou de espadas. Então, sim, existe esse aspecto, mas eu não pesquisei esses filmes. O fato é que esse cara está sozinho. Acho que, de certa maneira, a jornada dele – tanto pessoal como espiritual – é aprender a lidar com as pessoas novamente. Ele recebeu essa missão de proteger o livro, mas é como se a prova final para ele é lidar com as pessoas.

Quando você entra num projeto como este, que tem uma complexidade conceitual, o personagem já está bem definido para você? Você sentiu que precisava, ou queria, trabalhar bastante o personagem, para desenvolvê-lo e transformá-lo mais seu?
Bom, eu entrei no processo cedo, sabe, também sou um dos produtores. Alan, Albert e eu passamos uns bons cinco ou seis meses trabalhando o material. Eu meio que interpretava todos os papeis, lia-os em voz alta e estávamos afinando o material e o roteiro. Eu devo dizer que na primeira vez que viajei para o Novo México, foi interessante ver como os dois irmãos trabalham juntos. Albert é mais ligado à parte visual. Ele sabe de tudo, todos os tipos de câmera. Usamos umas câmeras digitais, de tecnologia muito nova, e eu fiquei muito impressionado com a preparação deles, a maneira como fizeram o storyboard e como seriam os efeitos. Não é um mundo sobre o qual eu sei muita coisa. Digo, já aprendi bastante, mas eles realmente vão atrás e tudo ficou ótimo, o visual ficou diferente, o que eu gostei. Foi um processo muito bom.

O filme é muito estilizado, quase um faroeste com clima pós-apocalíptico. Como você queria vestir o Eli e mostrá-lo para a plateia para dar o tom e refletir o que vocês queriam passar?
Bom, ele viaja com pouca bagagem, então passamos em algumas lojas de sobreviventes e ele também pega algumas coisas aqui e ali – não que isso signifique alguma coisa. Eu nunca usava cueca, porque ele não tinha nenhuma, já que de tanto usar gastou todas. Não foi tão difícil, mas fizemos uma coisa legal com os tênis, que são remendados e esburacados mas que na verdade são o último modelo do tênis do Lebron James. Eu acho que ele não tem uma segunda muda de roupas. Não cabe muita coisa naquela mochila.

Teve alguma coisa que você acrescentou para defini-lo visualmente, ou dar o tom do personagem ou do filme?
Bem, eu queria uma cabeça raspada e um visual limpo, mas eu estava deixando o cabelo crescer antes e olhamos aquilo decidimos que seria legal ter o cabelo grisalho, porque ele, Carnegie, Martha e George são considerados as pessoas mais velhas que restaram. Como eu não tenho uma boa barba, colocamos um preenchimento e deixamos grisalho. Mas ele ainda está em forma fisicamente e é um sobrevivente.

Você ouve alguma música específica para se preparar para um papel e, se sim, você ouviu alguma em particular para o papel de Eli?
Allen me parece mais um cara do som, enquanto o Albert é mais visual. Então o Allen juntou algumas músicas, tipo Nine Inch Nails e esse tipo de coisas. Meu filho, que está envolvido na produção, também contribuiu com a música e convenceu Allen e eu a usar uma música do Incubus. Eu acho que o Allen prefere a ideia de sons e não só música. Mas ele me deu um CD de músicas diferentes, como eu disse, algo entre Nine Inch Nais e Incubus e outras bandas.

Sobre trabalhar com o Gary Oldman, os ensaios entre vocês dois foram muito importantes ou quando você está no personagem prefere levar de maneira mais espontânea?
Nós não ensaiamos muito. Almoçamos juntos e conversamos algumas vezes antes de começar a trabalhar. Obviamente Gary é um ótimo ator, ele sabe o que está fazendo, é meticuloso com todos os detalhes. Ele é muito específico quanto aos figurinos, aparência, sotaques e toda essa coisa. Então discutimos tudo isso. Mas não quisemos nos aproximar muito porque somos dois estranhos que se encontram na história, então não combinamos muita coisas antes. Nós tivemos a oportunidade de ensaiar as cenas muitas vezes antes de filmar mas, sabe, é uma relação de rivalidade entre os personagens. Então acho que sabíamos disso e de certa maneira era melhor não ficarmos tão próximos. Quer dizer, nós conversamos mas não queríamos deixar o material já gasto. Queríamos só entrar em cena e ver o que acontecia, porque eu gosto de fazer isso. Gosto de improvisar, quando eles jogam as coisas para mim, reagir e ir nesse bate-bola.

Este filme é o mais recente de uma linha de filmes pós-apocalípticos com um herói solitário, e esses filmes aparecem em vários momentos da história. O que você acha que esse filme tem a dizer para as pessoas, nesse momento para o público norte-americano? Por que este filme agora?
Bom, sabe, eu acho que talvez seja um formato clássico. Meu filho é produtor associado no filme e foi ele quem trouxe a história para mim. Ele foi atraído pelo aspecto espiritual da história e achava que era importante. Foi ele também que me convenceu a fazer um outro filme, Dia de Treinamento, então eu meio que ouço ele. Ele realmente se envolveu com os roteiristas, diretores e assistia aos copiões e também vai se envolver no processo de pós-produção. Nós temos aqui a clássica batalha do Bem contra o Mal, e eu achei isso interessante.

Você mencionou que seu filho gostava dos aspectos espirituais da história. Que parte disso você acha que chegará à plateia em geral, e você acha que a história se torna quase uma alegoria por causa disso?
Eu acho que todos nós, em algum momento, buscamos alguma coisa, um poder superior ou seja lá o que você quiser chamar, o significado da vida. Eu sei que estava buscando isso desde que tinha uns 20 anos, começando a procurar filosofias orientais, yoga e budismo, cristianismo e o Islã. Eu me meti em todas elas tentando entender o significado da vida, ou, antes de mais nada, entender a mim mesmo. Então eu acho que tem isso, uma sede por entender isso. E também a clássica batalha entre o Bem e o Mal, especificamente para o Eli, que está há cinco dias de caminhada da Terra Prometida, de levar o livro ao lugar que ele pertence e, literalmente, encontra o inferno na Terra. Então acho que também é uma metáfora para a vida, como quando coisas boas acontecem você pode ser testado. E todos nós somos testados, de alguma maneira, então eu gosto dessa ideia da jornada espiritual desse cara.

Quando fomos ao set, assistimos à cena em que você está naquela casa e tudo dá errado. Parecia incrível, mas também era um dia de muito vento. Como foi filmar no Novo México, um lugar onde os elementos da natureza são meio imprevisíveis, e quais suas lembranças dessa cena específica?
Bom, agora eu definitivamente sei o que é uma tempestade de ventos. Mas foi o local certo para esse filme e as pessoas foram muito legais conosco. Sabe, eles têm uma boa equipe profissional agora lá no Novo México. O Governador visitou o set um dia desses então eu disse para tirarmos uma foto com toda a equipe local. Tem sido uma experiência maravilhosa. Tem sido meio difícil com o tempo, o vento e a areia e tudo isso, mas faz parte. Eu acho que ajudou o meu personagem.

E você poderia falar especificamente sobre aquela cena?
Foi divertido, cara. Especialmente com os personagens da Frances de la Tour e do Michael Gambon. Só de ver essa mulher mais velha, – eu não diria que ela é uma senhora velha, mas ela é mais velha que eu – essa mulher madura então, disparando uma AK-47. Acho que Mila Kunis diz algo do tipo “O que podemos fazer? Eu sei o que eu vou fazer” e pega a arma e começa a atirar. É meio bizarro esses dois velhinhos que tomam chá mas que também têm um pequeno arsenal. Ao ler o roteiro, isso era um dos pontos altos porque causa um estranhamento. Foi muito bem concebido pelo Allen e pelo Albert. O Albert realmente sabe o que quer, ele é o cara que cuida mais da filmagem, enquanto o Allen é mais o diretor de atores, o comunicador. Eu nunca tinha trabalhado com dois irmãos, mas eles sabem trabalhar muito bem juntos e conseguem fazer o dobro de coisas.

No início da sua carreira, você foi determinante em ajudar a meio que normalizar histórias multi-étinicas, eu acho, em filmes como Mais e Melhores Blues.
Muito obrigado, eu aceito totalmente o crédito por isso.

Minha pergunta: a etnia do seu personagem é relevante? E, num cenário mais amplo, a sua etnia e dos irmãos Hughes é, ou deveria ser, relevante e alguma parte da execução desta história?
Olha, é interessante. Eu tenho quatro filhos e o mais novo acaba de fazer 18 anos e é um mundo completamente diferente para eles do que foi para a minha geração. Eu lembro de na adolescência ir para o Sul, onde ainda não podíamos beber nos bebedouros. Acho que meus pais me protegeram disso quando eu era pequeno, íamos à praia de negros e não na de brancos e todo esse tipo de coisa – coisas que como pais precisamos cuidar para não colocar esse peso em nossos filhos. As coisas mudaram muito sabe, é óbvio, é só olhar para o nosso presidente. Claro que não vivemos em um mundo perfeito e ainda temos umas pessoas com seus velhos preconceitos por aí, e acho que as pessoas mais jovens são a força motriz dessa mudança e foram responsáveis por eleger o Barack Obama. Eles já estão vendo as coisas de forma diferente. Já chegamos lá 100%? Não, claro que não, mas já é um mundo diferente. Sabe, era um sonho para o Marin Luther King há 40 anos, mas já é uma realidade para a maioria das crianças hoje.

Fonte: Omelete

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